Menina ou menino?
Durante o último mês que passou, o impulso era aludir à minha posse no Banco Central, ocorrida há quarenta e cinco anos, em 12 de abril de 1972, quando vivíamos os horrores da ditadura militar, no período capitaneada pelo general Médici (me recuso a chamá-lo de presidente). Não estou com cabeça para registros bacenianos (recém terminei dez deles) nem tampouco para desvarios de regimes autoritários.
Pularei três casinhas do tabuleiro gregoriano para atingir ao 1º de junho de 1975. Noite avançada, eu ganhava um dos melhores presentes da minha vida. Aqui, na Capital da Esperança, e fechando o foco, na maternidade do Hospital das Forças Armadas, o famoso e eficiente HFA, nascia minha filha mais velha, Patricia, cuja bisavó paterna comemorava aniversário exatamente naquele dia de início das festas juninas.
Os mais idosos costumamos reclamar (do que os velhos não se queixam?): acabou o mistério, sabe-se do sexo da criança nos primórdios da gravidez. Brevemente, em meio ao bater de um par ou ímpar, já conheceremos o vencedor – ou a vencedora – pela temperatura das mãos dos contendores ou pelo número de piscadelas nervosas que irão dar. Na porrinha, nossa visão de raio X permitirá ver com antecedência quantos palitinhos há na mão fechada de cada um dos jogadores postados em frente ao boteco do Setor Comercial Sul.
Será a extinção desses dois jogos, o que é gravíssimo.
Assisti há algumas semanas a interessante vídeo no zap – aniversário de um menino. Pouco antes de se cantar o Parabéns pra você, interrompeu-se o evento para que as pessoas ali presentes conhecessem o sexo do bebê ainda no ventre da mãe do aniversariante. Ou seja, até então ninguém naquele ambiente de alegria e congraçamento, ninguém mesmo, era conhecedor de quem viria à luz dali a poucos meses, menino ou menina.
Numa espécie de palco improvisado, o pai, a mãe, o garoto que completava 7 anos e o seu irmão de 9 anos, quarteto nervoso; convidados e convidadas – a maioria, claro, crianças -, sentados nas cadeiras do salão formando ansiosa plateia aos gritos de “abre”, “abre”, “abre”. Queriam que fosse logo mostrado o conteúdo da caixa colorida chegada diretamente do laboratório de análises.
Não sem algum suspense e com muito nervosismo, a mulher de barriga ainda não pronunciada, ao lado do marido e dos dois meninos, começou a levantar a tampa daquela espécie de baú, quando lá de dentro, como se pela força do ar comprimido, pétalas de flores rosas “inundaram” o ambiente…
Integramos a sociedade do espetáculo, do bombardeio de postagens na internet, de todo mundo dizendo pra todo mundo o que se está vivenciando, geralmente de forma glamourosa, artificialismo a rodo.
Dobro-me no entanto ao motivo duplo de tal festa (comemoração e revelação), tanto assim que a divulgo algo entusiasmado.
Sendo impraticável nos dias de hoje aguardar-se realização do parto, que pais e mães abandonem a frieza da sala de espera dos laboratórios e passem a compartilhar a descoberta do sexo dos rebentos, festivamente, cercados de amigos e amigas.
Diversidade de gênero é história a ser contada em outro momento.
13/05/2017
(245)