O perfume (V)

Daí eu ter escalado para a tarefa uma patricía, que não é a minha filha mais velha, e sim pessoa nascida em Portugal.

Desclassificada desta Copa como eu (mas sem tanta humilhação), ela irá me ajudar involuntariamente na empresa de tecer comentários perfumados acerca dessa história quase toda acontecida em Paris. Não conheço Claudia Sousa Dias, minha colega, se assim posso me exprimir. Vi seu (dela) blog, do qual me aproprio transcrevendo trechos da postagem em que nossa colonizadora de antanho se dedica à obra.

http://ativarsentidos.com.br/visao/o-perfume-a-historia-de-um-assassino
http://ativarsentidos.com.br/visao/o-perfume-a-historia-de-um-assassino

“O Perfume é daqueles livros que, quando lemos pela primeira vez, ficamos com a incómoda sensação de que a maior parte do significado nos escapa, ficando escondido nas entrelinhas pelo ao elevado conteúdo surrealista subjacente, ao desenvolvimento da trama. O mesmo se passa com as motivações e a forma de pensar e sentir do protagonista.

“(…) A descrição inicial do fedor nauseabundo da capital francesa, por altura do nascimento de Jean-Baptiste Grenouille foi elaborada de forma a criar o maior impacto possível no leitor por forma a exaltar a sensação de nojo nos leitores. A profusão de detalhes, a minúcia, enriquecida pelas associações de olfactivas e visuais – com predomínio das primeiras – amplia a sensação anteriormente descrita pela repetição anafórica do verbo ‘tresandar’, ao qual são adicionados nomes e adjectivos de carácter repulsivo permitindo a reprodução (quase) exacta dos cheiros mais pestilentos.

(…) Jean-Baptiste Grenouille surge na trama arrastando consigo uma morte, despoletada pelo grito assassino que reclama o seu direito à vida implicando, simultaneamente, a morte da mãe por enforcamento. O destino da personagem está traçado logo à nascença: para sobreviver e triunfar terá de matarTerá de despir-se de qualquer sentimento de amor, solidariedade, fraternidade e tudo o que se relacionar com altruísmo e viver apenas e só para o seu EU. A fatalidade marca, pois, o início do seu nascimento e a orientação da própria conduta ao longo da vida, tal como, mais tarde o antraz lhe marcará o rosto, desfigurando-o.”

Conquanto macabro o tema, elogiemos a linguagem saborosa, interessante, inclusive o “despoletar”, repudiado por alguns críticos radicados na terrinha.

Vejam vocês que, pelas origens, já temos quase uma ONU ou, de acordo com o gosto do freguês, uma babel: eu, modestamente, Brasil; a blogueira, Portugal; o personagem do livro, França; e, por fim, o autor, Alemanha (essa é só um time em campo no Mineirão, mas como dói).

“Algumas pessoas sentem em Grenouille algo de anormal, alguém cuja ausência de odor, numa sociedade onde o banho não fazia parte dos hábitos de higiene diários – o que por si só aumentaria exponencialmente a incidência de um odor humano – o transforma num excluído social, numa espécie de espectro ou fantasma levando as pessoas mais sensíveis a intuir que há algo de errado dentro da alma árida de Grenouille – a rãzinha, o pequeno sapo, que princesa alguma irá beijar algum dia…

“Quem controlava os odores controlava o coração dos homens.

“(…) Decide (…) morrer por obra e graça da sua criação mais perfeita… uma morte desencadeada, mais uma vez por um excesso de paixão, despoletado por um Perfume cujo efeito é mais devastador do que uma bomba…Grenouille morre despedaçado, numa cena cujo teor surrealista e macabro quase poderia ser parte integrante de um filme de David Lynch…

“No último parágrafo o sentimento dominante é o da partilha de um sentimento colectivo de satisfação, com uma ambiguidade de significação que leva o leitor a perguntar-se: que tipo de amor pode desencadear um acto de canibalismo?”

 

14 de julho de 2014

(076)

mmsmarcos1953@hotmail.com

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