
A História é amarela 7 (Michael Schumacher)
(…) quando a gente se esforça demais para parecer uma versão melhor de nós mesmos, essa acaba sendo a nossa pior versão.
– Manuela Cantuária –
Deve ter uns bons dez anos que não assisto a uma corrida de Fórmula I na tevê.
Ausência de grandes pilotos brasileiros desde a fase ufanista do ninguém segura este país de Fitipaldi/Piquet/Senna? Em realidade Rubinho Barrichello e Felipe Massa, a dupla supérstite, nunca chegaram a empolgar – o primeiro virou motivo de chacota, bombando nos programas de humor; o segundo, no pelotão dos cinco melhores, sentou-se numa época no trono do quase-quase.
Do qual, sejamos justos, poderia ter se levantado e ido para o do rei, não fora a barbeiragem da equipe Ferrari numa das provas, autorizando a saída do carro quando a mangueira do combustível ainda estava presa ao tanque, perda de tempo fatal para as pretensões de Felipe Massa de subir nos então alcançáveis pódios restantes e faturar o campeonato mundial praticamente nas mãos.
Já que tocamos no assunto, que tal chamar à colação talvez o maior piloto da história do automobilismo? Profissional que nunca amarelou, mas que agora, passados vinte e dois anos da entrevista às amarelas da VEJA, ressurge neste tópico do blog. E no estilo de sempre, direto, franco, categórico e às vezes antipático.

– Foi um momento muito dramático (acidente em 1999 na corrida da Inglaterra). Tive medo ao ver a parede de proteção se aproximando de mim numa velocidade altíssima. Um ou dois minutos depois do choque tentei sair do carro.
É aí que começava o drama do alemão, que sempre soube muita coisa, muitas profecias dele se confirmaram ao longo do tempo. Todavia, uma desgraça mais forte ainda, dez anos depois dessa entrevista, prefigurava-se no horizonte, ou melhor, na montanha nevada. Volto ao depoimento à revista.
– Destravei o cinto, mas não consegui mover a perna. Os socorristas chegaram, porém eles também não conseguiam me tirar. Eu estava preso. Finalmente me tiraram e o médico me mandou deitar. Nesse instante eu tive uma experiência realmente estranha da qual ainda me recordo como se fosse ontem. Eu podia ouvir as batidas do meu coração, mas, de repente, tudo ficou escuro e senti que ele ficou batendo cada vez mais devagar até parar por completo. Foi exatamente isso, nessa sequência. Eu fui reanimado pelos médicos imediatamente, porém vivi uma cena que só tinha visto em filmes. Foi o pior momento da minha vida.
Esta postagem poderia ser findada agora, já estampado todo o drama vivido pelo piloto, prenúncio de outro e mais terrível acidente, que o jogou numa existência chamada vegetativa que perdura até hoje. Opto por nada sonegar aos leitores e leitoras deste blog – se é que alguém irá se debruçar sobre meus escritos -, enfio o dedo nas borboletas das marchas no volante e torno à competição.
– Eu sou uma pessoa que acredita no destino. Minha profissão não é tão perigosa quanto parece. As possibilidades de morrer são muitas para todo mundo. Não acredito que, se parar de correr, terei maior chance de viver mais tempo. Nos primeiros momentos após o acidente, pensei em parar de correr. Depois percebi que correr é o que gosto.
– Senna sempre se dedicou muito ao que fazia. Sempre deu o máximo de si. O estilo de Senna era muito preciso. Parecia que dirigia sem muito esforço físico, tinha um talento natural. Nigel Mansell dirigia como um jogador de rúgbi inglês, e Senna, como um jogador de futebol brasileiro.
– No inverno eu sinto muito frio em torno do pescoço, nas mãos e nos pés. As temporadas de treino ocorrem sempre no inverno e nós pilotamos em temperaturas abaixo de zero. É estranho porque faz você sentir ao mesmo tempo calor em outras partes do corpo, como por exemplo nas costas. As costas sempre ficam molhadas de suor. Nas corridas em lugares quentes também não é confortável dentro do carro. O vento da velocidade não refresca nada ali dentro.
– Não sou emotivo quanto outros pilotos. Sou muito centrado e um grande pessimista(…). Por isso, minha dedicação é elevada. Isso não quer dizer que eu seja imune ao sofrimento. Fico triste e me sinto vulnerável como todo mundo. Talvez não demonstre tanto. Quando assisto a um filme romântico ou triste, muitas vezes choro como qualquer pessoa.
Avisto lá na frente da pista o safety car entrando praticamente na hora da bandeirada final, me toco que meu tempo acabou, ouvindo antes o entrevistador, jornalista Eduardo Salgado, indagar sobre o que preferiria Michael Schumacher: morrer numa corrida ou passar o resto da vida numa cama. O célebre piloto devolveu na lataria:
– Não quero pensar nessas coisas nem como hipótese. Acho que meu destino está traçado.
15/07/2025
(380)
mmsmarcos1953@hotmail.com

Obsessões Musicais XXXIII
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