Retiro o que eu disse

Quando trabalhava com personagens, uma coisa que me agradava era quando ele ganhava vida própria. Parece clichê de autora de quadrinhos, mas é verdade, acontece. Quando ele reflete de uma maneira completa e harmoniosa, quando há sintonia entre criadora e criatura, acontece de ele te surpreender. Quando você percebe, já fez. E você pensa: “De onde saiu isso?
– Laerte –

O nome é ótimo, embute confissão e arrependimento. É sob esse rótulo que a dupla de atores Nelson Freitas e Stepan Nercessian idealizou poadcast para receber personalidades das áreas do cinema, do teatro e da televisão, que tomam assento e desempenham papel de entrevistado(a), desandando a contar as mais saborosas histórias dos bastidores da vida artística.

Vindo à luz em outubro de 2024, o programa foca no passado e sem embargo lança luzes no futuro ao dar aulas multidisciplinares para quem pretende seguir nessa carreira de ator/atriz, na maioria das vezes pouco promissora, muitas promissórias para sustentar uma produção, a justificar o que meu pai vez em quando observava e eu parafraseio: ora calça de veludo, ora bumbum de fora (aqui, não é show de strip, é metáfora da indefectível falta de grana da classe – nos últimos tempos, agravada pelo contrato por trabalho certo, folha de pagamento minguada, o anel que tu me deste era vidro e se quebrou).

Rodada às quintas-feiras em estúdio “nababesco”, envidraçado – o público às vezes para e dá tchauzinho -, num shopping de Jacarepaguá (bairro da zona oeste do Rio de Janeiro, longe pra karila do centro da cidade), a iniciativa tem o declarado e meritório objetivo de angariar recursos financeiros em prol do também situado em Jacarepaguá Retiro dos Artistas, advindo daí, desse trocadilho, a pertinência do nome do programa.

Durante a transmissão, são reiterados os pedidos dos dois apresentadores para que apontemos nosso celular para o QR Code na tela de modo a enviar quantias destinadas à manutenção do relevantíssimo espaço de convivência e guarida para quem, já na última quadra da vida, não consegue morar sozinho, seja por precisar ter companhia de alguém em casa, seja por hipossuficiência financeira. Esse lar coletivo, disposto como se fora uma vila de casa, não é um asilo como a gente conhece e despreza. O “Retiro” vem sendo presidido pelo Stepan há mais de vinte e dois anos, que ademais andou um bom tempo à frente do sindicato dos artistas da ex-Guanabara, e pretendo visitá-lo em abril próximo, quando completarei a bilionésima oitava viagem a minha terra.

O clima é de galhofa (epa! o Stepan tirou o tênis e assim ficará até o final), um apresentador esculachando o outro quase que o tempo todo, porém é evidente que ambos se gostam e se admiram, decerto dois colegas e amigos de longa data. Tratam com total respeito e, não raro, admiração, todos(as) os(as) artistas que até o momento compareceram para dar entrevistas e contar suas realizações e peripécias, a grande maioria contemporânea entre si, numa dedução lógica turma do 50+ até ao 70+.

Não se impressionem negativamente, o programa não é bolorento, estacionado no passado, nada disso. As narrativas se desenrolam com tanta verve, humor desbragado, nos levando a prever que irá durar muito, apesar de que o Nelson não passa minuto sem dizer que a atração tem seis ouvintes, que a respeito dela só se fala em outra coisa e que não dá para não perdê-la.

Em ordem alfabética, e não por data de entrada em cena, seguem os personagens (e os links) que apareceram por lá nesses quase três meses, salvante alguma omissão minha. Divirtam-se.

#Retiro o que eu disse
#Laerte
#Retiro dos Artistas
#Nelson Freitas
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