Cristalina (IX)
É maçaranduba o pau de que é feito o cabo da enxada? Mesmo que de bambu, o desfecho não seria diferente. Sem largar da obsessão da cornitude, o homenzito cansara de ser plateia. De modo não mais passivo, desceu da gávea (relevem-me a figuração novamente neste blog) e, travestido de caçador sem espingarda, crispou-se na tocaia, atrás do tronco de árvore mais grosso e cúmplice. A seu turno, a caça percorria o trajeto de todos os dias, montado na bicicleta com a cestinha de livros repletos de poesia.
A pancada inaugural e contundente trincou o peito do ciclista, que não mais lograra se recompor, uma vez que, além de coxo de nascença (como firmar as pernas trêmulas?), o ar lhe fugia dos pulmões perfurados pela ação de ossos partidos e fora de conjuntura, verdadeiros punhais a formar desenho macabro de um joguinho da minha infância.

Por acaso espectadores privilegiados da emboscada, teríamos assistido aos golpes desferidos pelo Zé Lobó no tórax do impertinente admirador de mulher comprometida, os quais, pela virulência e estrago, chocaram os veteranos e calejados paramédicos da ambulância que transportara para Brasília a vítima, desde o início da viagem sem veio poético, quilômetros adiante sem veia nem nada, apenas um corpo destinado à necropsia.
19 de abril de 2015
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