Satélite 061

E…/Um trem de luxo parte/Para exaltar a sua arte/Que encantou Madureira
Mesmo com o palco apagado/Apoteose é o infinito
Continua estrela/Brilhando no céu.  

(Jorge Aragão)

O Mapati foi convidado a participar, nesse último fim de semana, do Satélite 061, evento realizado na Torre de TV.

E participou.

No primeiro dia, sábado, nossa encenação teatral não transcorreu bem; aliás, foi sofrível, muito ruim. Ocorreram problemas técnicos de som porquanto, nas imediações da Torre, há constantes interferências de sinais de toda espécie, temível armadilha sobretudo para uso de microfones de lapela ou auriculares, que era o caso de nossos atores (2) e atrizes (4). Demais disso, enfrentamos uma “concorrência desleal”, o barulho quase ensurdecedor do palco próximo ao local onde se encontrava nosso caminhão, DJs ativando as picapes e a galera (acho esse termo enjoado, meio apelativo, artista querendo cumplicidade e adesão da plateia) se esfalfando, dançando catarticamente, prazerosamente.

Tomamos a resolução de no domingo mudar o veículo de posição e o estacionamos bem afastado de tudo, na área que os produtores chamam de limbo, a faixa de gramado mais perto da entrada da W3 Sul. Ainda assim, nós e os espectadores acabamos padecendo um tico com o som que provinha do palco principal.

foto: Marcos Martins
foto: Marcos Martins

E era nesse palco mais importante que estava prevista, para o segundo e último dia, performance de um grupo de baianas.

Aflorou de conseguinte o encargo e alguém da nossa produção teria de buscá-las em Samambaia e levá-las de volta. Quem foi designado para a empreitada? Dica: não poderia ser ator/atriz, diretor/diretora da peça, pessoal da equipe técnica e de apoio. Recomendável um indivíduo disponível. Respondo: escalaram o blogueiro menos lido do mundo, o revisor dos textos institucionais do Mapati (sem cabedal para tanto), o motorista do caminhão, o motorista da van, atributo mais importante naquele momento. Eu mesmo.

Em lá chegando, Samambaia Sul, vi que, além de algumas crianças, as artistas eram mais de dez, além do Téo, tanto ele quanto elas caracterizadas. Como seria possível a van acomodar aquelas vibrantes mulheres com seus vestidos que evocam acarajés, abarás, terreiros de umbanda, de candomblé, Elevador Lacerda, Mercado Modelo, Pelourinho, escadaria das (centenas) igrejas de Salvador?

foto: Marcos Martins
foto: Marcos Martins

Senhor Detran, tudo funcionou mais ou menos certinho, o Código Nacional de Trânsito restara interpretado e aplicado da forma a mais inspirada e transcendente, sob o batuque dos tambores, o que era enriquecido com o vozerio daquelas guerreiras com suas saias brancas rendadas, diáfanas. Não sabiam as baianas que os cânticos entoados me jogavam em direção ao tempo em que este sincrético blogueiro se aconselhava com a Vovó Maria Conga do Balaio da Bahia.

foto: Marcos Martins
foto: Marcos Martins

À certa altura do trajeto de ida, paramos pelos lados do Riacho Fundo. Ali, resgatamos um rapaz, filho da baiana que vinha no banco da frente (mais um passageiro a disputar espaço no veículo). Sucedeu que uma das mães de santo começou a sofrer revoluteios no estômago e carecia se purificar. Foi o tempo de ela sair da van em passos apressados para, atrás do ponto de ônibus, verter o golfo indesejado, regando as plantas ressequidas com o que não mais servia a ela e à filha abrigada no útero cálido. O curioso é que não houve mamãezada da parte dos passageiros e passageiras, nada de comiseração. Fizeram foi debochar e brincar com ela, que me pareceu agradecer por sua vez o “tratamento de choque”, eficaz sem nenhuma dúvida, tanto que ela se recompôs rapidamente da agrura típica das grávidas (mulher sofre).

foto: Marcos Martins
foto: Marcos Martins

O pretexto de alinhavar esta postagem é só o de agradecer pelos calorosos e tocantes momentos que vivi misturado àquela turma de mulheres em sua maioria. A união e o entrosamento entre as companheiras nas duas curtas viagens me propiciaram revisitar o clima dos subúrbios do meu Rio de Janeiro quando não assolados por desgraças, balas perdidas, descasos.

E o melhor de tudo é que, antes de ir embora, elas distribuíram saquinhos com doces e balas de Cosme e Damião a todas as pessoas presentes à realização do Satélite – 061.

 

28/09/2016

(211)

mmsmarcos1953@hotmail.com

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *