Quem cuidará de nossos pais? (V)

– Como a senhora está se sentindo hoje, mãe?

– Mais ou menos. Você deveria vir mais aqui.

– Mãe, eu vim ontem…

– Por que você está me chamando de mãe? Você não é meu filho.

– Sou, sim.

– Eu gosto de você, mas você não é meu filho.

– Bom, eu te amo mesmo assim.

Diálogo relatado pelo filho de uma portadora de Alzheimer,
que vive em Belo Horizonte, durante o encontro de um grupo de apoio.”

Não foi tão fácil alcançar a quinta postagem. Estou fatigado, daí a conveniência de encerrar, ou interromper, estes tópicos, não sem antes extrair mais algumas passagens do livro da Marleth, constantes do capítulo 11, aberto com o diálogo acima reproduzido.

A primeira parte é de autoria da escritora, que já nos arrebata desde o início; a outra é a transcrição do teor do depoimento de Neusi Rovel, personagem sujeita às vicissitudes do papel de cuidadora da mãe – que, se ainda viva, terá hoje 93 anos de idade.

“Cuidar de um idoso demente vai além de assumir as tarefas que garantem a sobrevivência dele – é preciso fazer o luto pela pessoa que desapareceu e, ao mesmo tempo, aprender a conviver com uma pessoa diferente. A demência não rouba apenas a habilidade do idoso de lembrar nomes ou compromissos, rouba dele a personalidade e as memórias mais significativas. O vazio que fica é ocupado por uma confusão de reações e alguns sentimentos que o próprio doente não consegue entender nem controlar. Resta à família cuidar de um quase estranho, de alguém cujo rosto e voz são familiares e comoventes, mas que age de forma que pouco lembra aquela pessoa querida que nós conhecemos desde sempre.

“(…) O portador de demência não se dá conta das preocupações que está causando à sua família. Ele não tem condições de poupar ninguém, de se esforçar para tornar a vida do cônjuge ou dos filhos mais fácil. Tampouco fará algo ‘por mal’. Inconformados com a situação, alguns familiares reclamam da falta de cooperação por parte do idoso, ou tentam se convencer de que as coisas desagradáveis que ele faz hoje são frutos da mesma personalidade que carregou a vida toda, agora piorada pela doença.

“(…) Ser racional com alguém que perdeu a capacidade de raciocinar é frustrante, exaustivo e inútil. Além do mais, você irrita o doente, que vai vê-lo como inimigo que tenta esconder o que ele sabe que é certo. E nesse ‘inimigo’ o doente vai despejar toda sua agressividade.

“(…) Como se trata de uma doença para a qual não há cura e o máximo que se consegue com medicamentos é reduzir o ritmo da evolução, o cuidador é torturado pela sensação de impotência e de incapacidade. A família quer dar qualidade de vida ao doente, mas não sabe o que é qualidade de vida para ele.

“(…) É hora de deitar um olhar carinhoso sobre o doente, de lembrar quem ele foi, de rememorar suas qualidades e habilidades para não nos distanciarmos das boas lembranças. De valorizar o esforço que o doente faz o tempo todo para entender o que se passa a sua volta, para se comunicar. De nos alegrarmos com o bem-estar que damos a ele quando lhe oferecemos carinho e atenção.”

 

http://luanb.tumblr.com/post/3470303212/e-junto-de-voc%C3%AA-quero-formar-aquele-casal-de
http://luanb.tumblr.com/post/3470303212/e-junto-de-voc%C3%AA-quero-formar-aquele-casal-de

Pelo visto, e sentido, terei que deixar o relato da Neusi, professora aposentada, residente na capital paranaense, para a sexta e provável última postagem.

 

30 de novembro de 2014

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mmsmarcos1953@hotmail.com

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