Bacenianas (IX)

Ele perdeu tudo e não quis se separar do vidro com o pênis dentro
para ter uma referência do que poderia ter sido. Isso tem a ver com a situação do Brasil. O livro (Pilatos) foi escrito em 72, logo depois dos acontecimentos políticos do final dos 60. Havia um clima de questionamento
do que seria a condição humana. E eu achei que um homem sem o pênis seria talvez símbolo do homem da época.

 
(Carlos Heitor Cony, em entrevista à Folha de São Paulo de 10/03/2001)

Fechado o despacho – quer dizer, a cota -, vamos correndo cuidar do álbum do Ede, que ficará completo no momento em que conseguirmos as duas figurinhas restantes, ambas carimbadas.

A primeira, aliás, nós já temos.

Início da tarde, bexiga explodindo, nosso protagonista um poço de sacanagem entra num banheiro do Edíficio-sede do Banco Central, prédio de quatro torres que não tem frente, não tem fundos e dá para quatro lados. Girando da esquerda para a direita: SQS 202, Hospital de Base, Rodoviária, Lago Paranoá, sendo difícil apontar agora a torre para onde ele se dirigira em busca de alívio. A rigor, o episódio deve ter acontecido em outro prédio do Bacen, talvez o Palácio da Agricultura, o que pegou fogo e hoje está uma belezura. Mas isso é questão de Cep, não tem a mínima importância.

Relevante é que, ao ladear o Nadir (vocês sabem que uso somente nomes fictícios) no mictório sem paredes laterais, privacidade nenhuma, o Ede deu um grau e ficou chocado com a relevância da estrovenga do colega, que despretensiosamente balançava-a pra cima e pra baixo de modo a expelir as derradeiras gotas do líquido vertido. Na cabeça (de cima) do novidadeiro, os comandos e impulsos cerebrais ditavam que era hora de sair dali e propalar a sensacional descoberta.

Malicioso, fez de imediato um link com supostos propósitos e desejos de integrante da cúpula da inspetoria de mercado de capitais, tido por gay. Neste passo, não inventarei um nome, inventarei um apelido, permanecendo mais seguro ainda em minha comfort zone. Mercê dos reconhecidos e sólidos domínios sobre os assuntos da área, o Vavá ocupava alta função, no exercício da qual podia comissionar ou descomissionar subordinados e subordinadas através de simples canetada. Daí que, já com a bexiga vazia e em ambiente de homofobia generalizada, saiu o Ede no maior alvoroço a cantarolar pelos setores pretendendo que todas as colegas (recatadas ou não) e todos os colegas (sacanas sim) ouvissem o arauto:

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“Nadir vai ser inspetor geral, tra, lá, lá, lá, lá, Nadir vai ser inspetor geral, tra, lá, lá, lá, lá, Nadir vai ser inspetor geral, tra, lá, lá, lá, lá”.

O pessoal somente foi compreender as razões da anunciada progressão de carreira do Nadir ao fim da tarde, no cafezinho da copa, local de fofocas e maledicências nas empresas e órgãos públicos de qualquer país do mundo.

Superada minha inveja, não pela progressão, mas pelo crescimento, marcho neste instante em direção ao jornaleiro para comprar a última figurinha.

24/03/2017
(238)
mmsmarcos1953@hotmail.com

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