O seu futuro está em você (II)
Muitos habitantes da Capital Federal acham que Brazlândia pertence a Goiás. Talvez a errônea ideia se explique por ser uma das cidades satélites (quem foi que nos proibiu de chamá-las assim, poeticamente?) mais distantes de Brasília e se encontrar situada quase que no portal de Pirenópolis, esse, sim, um município já dentro do território goiano, com toda a sorte de pousadas e restaurantes, alguns dos quais com o distinto pequi no cardápio (não estou pichando nem elogiando o item alimentar).
Foi para tal Região Administrativa do DF que há muitíssimos anos me desloquei objetivando, por assim dizer, uma consulta espiritual. A pessoa que, mediante os poderes da clarividência, iria destrinchar minha vida e particularmente minhas idiossincrasias era recomendada por inúmeros conhecidos meus, A bem da verdade, de toda verdade mística, eu não levava muita fé nos poderes da mulher que me abrira sua poderosa agenda, um ceticismo que se adensava à medida que eu vencia os cinquenta quilômetros do percurso entre as duas localidades.
Chego ao meu destino.
Um pouco hesitante, ressabiado, cabreiro, como o paciente que deseja saber seu estado de saúde mas teme a leitura do diagnóstico médico, adentro a casa decorada sem luxos ostentatórios. Tudo impecavelmente limpo e no lugar. Repontam sincreticamente santos católicos e divindades do candomblé adornando os vários altares multicoloridos contemplados pela luz mortiça de velas de todos os tipos e tamanhos.
Circunspecta e segura, a clarividente deflagra os procedimentos para transparecer quem eu era e a minha circunstância (obrigado, Ortega y Gasset). A função se desenrola nesses parâmetros e não há ainda espaço para inquietudes. A gente conhece – embora não admita – nossas falhas de caráter. Vergo feio quando minha consultora, desprendendo-se dos fatos presentes, abstraída do que vogava naquela ambiência, lança-se, ultra petita, no campo da premonição.
Desde sempre temeroso, renego o devir, obliterando todas as revelações feitas pela impassível pitonisa.
Menos uma delas, inolvidável: “Vejo tiro, polícia, confusão”.
13 de março de 2015
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