Memórias/Memorialistas (LIII)

Continuemos nosso périplo através das páginas do Chão de ferro, volume 3 das memórias do Pedro Nava. O episódio em tela, visto na coligada postagem anterior, fora escrito nos anos de 1970, em reportagem de episódio ocorrido por volta de 1918.

Paul Gauguin

No consenso atual, cuidar-se-ia (Fora…) tecnicamente de assédio sexual, malgrado a condescendência da vítima diante de recônditos atributos do primo do formidável escritor mineiro. Quebro o suspense.

“Foi quando o Zegão ouviu um estalo como de junta de gente andando devagar. Tapou a cabeça tremendo todo e pensando na prima. Ia aparecer. Ele tiritava sentindo
seu caminhado. Parou ao pé do divã de palhinha em que ele dormia. Tocou-lhe o ombro. Ele pulou, ia gritar quando reconheceu a forma de Maria (…).”.

Clicando o trecho adiante, o que se vê é junção amorosa e sensual, dissecada ao depois por Gilberto Freyre no Casa Grande & Senzala.

“Ela ajoelhou e sussurou no seu ouvido que também não podia mais de medo. Como foi? que eles deitaram juntos no sofá. Imóveis e quentes. E quanto tempo levou? para a mão do Zegão fingindo sem querer encostar, parar, tirar, voltar, demorar, levantar a camisa, sentir a pele duma perna, subir, sentir a moita crespa, descer até descobrir o botão duro duro duro e por baixo tudo molhado e gosma quiabo clara de ovo. No escuro e no silêncio as pernas se abriram e ele cravou. Naquele tempo de escrúpulo e de inocência só se comia coxa. Mas ele não podia mais e virgem ou não, tinha de ir… Era estreito e fundo. Rodopiava como o funil de vazio rodando na água quando se destapa um banheiro. Era quente e chupava como um rodamoinho maelstrom num melado quase no ponto. Depois que estava dentro procurou a boca que procurava a sua. Sentiu primeiro os lábios como entrefechado cravo um pouco áspero cheio de películas, logo a aberta rosa úmida e fresca. Mas à flor dava lugar a fruta e foi o carpo cru duma longa língua que ele sugou. De deslumbrado nem se mexia. Ela sim, como um escorpião machucado como lacraia mal pisada é que se retorcíasse. Dera duas sem tirar. Depois da terceira, todo o porão cheirou a bananeira cortada, frutafolhamachucamassada suor lua no mar maresia (…).”

Aqui, a linguagem do Nava se externa em conluio com os estilos do Dalton Trevisan e do Rubem Fonseca. Salienta-se o constraste entre as duas peles, atavicamente, adensando a carga sexual disposta na cena.

“A pouca vergonha do Zegão era mais teórica do que outra coisa. Por enquanto. A menina era só instinto, parece que era mesmo virgem e que o primo é que lhe metera os tampos pra dentro. Ele próprio me disse que ficou besta como em poucos dias eles tinham passado daquele bê-a-bá de trepada, subido todas as escalas (…). Pena a escuridão. Só rapidamente é que ousavam às vezes acender uma vela para verem um instante a propria nudez e as duas cores dos seus abismos – nele, certo róseo, nela certo roxo (…).”

Cai o pano, voyeurs  degredados pela força do virus mortal.

“Assim fui acompanhando aquele romance que eu seguia como paixão que fosse minha. Terminou com a influenza na mulatinha. Forma fulminante que cortou aquele flor em três dias. O pobre Zegão como um viúvo menino, seguiu para Belo Horizonte (…).”

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 17/11/2017

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mmsmarcos1953@hotmail.com

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