Memórias/Memorialistas (XLVI)

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Eu, eu sou um Jumento. Não sou bicho de estimação. Não tenho apelido,
não tenho nome, nem estimação. Sou Jumento
e pronto. Na minha terra também me chamam de jegue E me botaram
pra trabalhar na roça a vida inteira. Trabalhar feito um Jumento. Pra no fim…..nada.
Minha pensão, nenhuma cenoura. Acho que é por isso
que às vezes me chamam de burro.
Eu não me incomodo
(Os Saltimbancos, Chico Buarque)

Era visível o desconsolo do Pedro Nava. Não havia medicamento nem suporte psíquico suficientes para tirá-lo da depressão. O grande médico chegara a esse lamentável estado depois que eu o mantive por mais de três meses afastado deste blog. Como se dizia no tempo de meus avós, exagerei na dose.

Diligencio agora a continuidade da participação do conterrâneo do meu pai e com isso levo tranquilidade e paz de espírito ao maior memorialista deste país.

Que, deseducado, não me franqueia essa paz. Ao revés, o escritor de Juiz de Fora, das Minas Gerais e do Brasil (fosse francês, britânico ou  americano, e seria do mundo), mal agradecido, provoca inquietude. A mim e a grande parte (sem trocadilho) dos homens de boa vontade neste vale de sofrimentos e frustrações.

“O veterano começou longa e confusa explicação sobre certas praxes do colégio, que deviam ser obedecidas à risca. Que eram, notem bem! obedecidas à risca. Mencionou cerimoniais iniciáticos referentes aos dormitórios, ao refeitório, às aulas, à instrução militar e aludiu, por fim,
a certa tomada de medidas, feita ao acordo de duas partes ajustadas,
para a menos bem dotada submeter-se completamente ao arbítrio do favorecido pelas proporções.”

Não adianta a mulher compreensiva (ou não) dizer que não liga pra isso, que tamanho não é documento, que o que importa é a empatia, é o entrosamento entre o casal na hora íntima. Para os homens, mesmo os ditos sensíveis, a questão fálica é sempre física, é de dimensão. Um fracasso no teste do vestiário pode derrubar o cabra pela vida inteira.

Comigo, por exemplo, foi tranquilo, superei a queda (sem trocadilho) galhardamente, me bastaram tão só: duas falas do revolucionário papa argentino; vinte e cinco anos de análise; três regressões acompanhadas por médicos, psicólogos, psiquatras e médiuns; oito anos de yoga (deram de inventar a yôga); dois anos de igreja messiânica; cinco anos de budismo; seis meses na umbanda; seis meses no candomblé, três semanas no kardecismo, dezenove palestras motivacionais, noventa e dois livros de autoajuda.

“O bicho, sem pestanejar, sem escândalo, até que mostrou-se muito interessado por esse tipo de aposta e à policitação do Papai Basílio, aceitou competir. Todos aplaudiram aos gritos, pedindo exibição imediata dos documentos. O veterano, esperando vitória fácil, nem se preparou e sacou, sem massageá-la previamente, peça macrocefálica, fina de arraigada, forma triangular e respeitável. O novato certificou-se bem, examinou bem e de repente, rindo e já com outra expressão no rosto canalha e despido de máscara de donzel mostrou a todos uma desconformidade só comparável àqueles enrolados de presunto e toucinho de fumeio que os italianos chamam capiola. Triunfante exigia o pagamento da aposta, que ele fazia questão, que podia ser sábado, na Quinta, no porão da casa dele, onde o quisesse um Papai Basílio atônito, fracassado, desbaratado, rabo entre as pernas, corrido, já em fuga e perseguido pelas chufas do colégio inteiro. Logo o novo ganhou apelido que iria enriquecer o grupo zoológico das focas, ratazanas, saracuras, dos ratos, micos, touros, cavalos, gorilas, ouriços e bois-da-zona já existentes no colégio. Seria do primeiro ao último ano o Jumento.”          

25 de julho de 2016

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mmsmarcos1953@hotmail.com

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