Memórias/Memorialistas (XXXV)
“E, quanto mais mergulhado no passado, mais moderno sou.”
(Lêdo Ivo)
Nesse passeio pelas instituições francesas dos anos de 1930, sob a batuta do Paulo Duarte, inveja não me faltou, não me falta agora nem me faltará nas próximas postagens a respeito do tema. Não é complexo de vira-lata, é reconhecimento do que seja, pela História, uma sociedade avançada, uma sociedade madura, na linguagem dos economistas, linguagem que só perde em chatice para a minha.
Tudo resultaria mais pragmático, mais contornável no sentido de superação de dificuldades institucionais se, açoitados como estamos pelos problemas políticos tão graves no Brasil de hoje, vivêssemos debaixo do parlamentarismo, sistema no qual votei, em 1993, por ocasião do confronto plebiscitário com o sistema presidencialista. Se ainda inviável, apelaríamos para o semipresidencialismo
O episódio contado por nosso memorialista é de votação dum projeto de orçamento, facetas econômicas parecidas com as do Brasil, particularmente nos últimos vinte anos, pois se falava em medidas voltadas para cobrir “o astronômico alcance deficitário de milhões de francos”.
E o que exatamente acontecera na França há mais de oito décadas?
“… o projeto do ex-Ministro das Finanças adotara os mais violentos meios cortando despesas e ampliando a arrecadação fiscal com o aumento dos impostos. Houve agitação na imprensa e nos meios políticos. A representação socialista provocou a crise. A campanha principiou a explorar, principalmente, dois pontos: o aumento da contribuição fiscal mais para as classes trabalhadoras e menos para as camadas a que chamam parasitárias e o corte nas pensões dos mutilados da guerra e mortos em combate. Povo essencialmente poupador e de patriotismo exaltado, formou-se imediatamente opinião contra os golpes que mais podiam ferir os dois pontos nevrálgicos: o bolso e o sentimento de carinho e respeito para com aqueles que se aleijaram na defesa da França. Houve cartazes pelos muros e paredes. Ninguém rasgou esses cartazes, nem mesmo agentes ou amigos do governo contra o qual eram eles redigidos; houve assembléia na sala Wagran, que é a praça pública dos comícios parienses; houve reuniões políticas; a imprensa se polidividiu, os partidos se manifestaram e ao fim o sr. Paul Boncourt caía com seu gabinete.”
Projeto de lei orçamentária é assunto duro e áspero, tanto na fase larvar – a da apreciação por comissões técnicas e da votação em plenário – quanto na de verificação dos efeitos incidentes na população após a chancela do parlamento.
O que cumpre salientar neste apanhado é a postura dos deputados e senadores franceses na sua atividade legislativa vis-à-vis o comportamento dos cidadãos.
Logo a seguir.
10 de fevereiro de 2016
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